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terça-feira, 6 de outubro de 2015

Alberto Cuddel - Participação no concurso Literario "O Vicio"

O PODER DO VÍCIO - 6º Concurso Literário - ALBERTO CUDDEL - "O VÌCIO"


O VÍCIO




Sou, existo, agarrado ao vício, viciado!... Nasci, fruto do vício dos meus pais, do vício de viver, do fabuloso vício de se amarem, e por não terem adquirido o vício da contraceção. Nasci assim portanto em privação, com o vício de viver intensamente, de amar e ser amado, e adquiri outros vícios, como me viciei, na mamada, de três em três horas lá estava dando sinal, querendo mais, muito mais, tinha o vício do leite, de alimento… O leite, esse foi o primeiro vicio perdido, corria o ano de 1974, na tarde do décimo sexto dia do mês de maio, o meu mundo desabava, estava eu com 16 meses, uma idade complicada para se perder vícios, mas de pequenino é que se torce o pepino, nessa tarde nascia a minha irmã, mais viciada ainda que eu, ávida, sedenta de leite, pequenina, mas arisca, de um choro incontrolável, de fazer doer a alma, eu feito forte, e afirmando-me na minha pequenez de homem, afirmo a pés juntos – O leite é para a nina. Coitado de mim, mas ainda hoje não bebo leite, um vicio vencido, (um dos poucos ou se não o único).
O vício de viver continua a sua saga, com 5 anos sou entronizado em outro vício que ainda hoje me acompanha, pela mão da minha mãe, descobri as letras, a representação gráfica dos sons, aprendi a ler e escrever ainda antes de entrar na escola. Bendito vicio, devorei quanto existia em casa, na casa de familiares, mesmo os que não eram próprios a uma precoce idade. Tal vício abriu em mim uma fome de conhecimento, uma vontade de saber, um gosto especial por brincar com as palavras.
Mas a vida segue o seu rumo, e depressa chegamos à adolescência, idade terrível, onde o corpo e a mente se abrem a toda a espécie de vícios, reais, materiais, ficcionados, sentimentais… A descoberta do corpo, dos prazeres carnais, das substâncias geradas por nós mesmos, das adrenalinas, serotoninas, do palpitar dos corações, do vício das primeiras paixões. Foi uma fase de conflito interno, se por um lado o corpo clamava a altos brados pela entrega aos vícios da carne, por outro, a mente, fruto de uma educação rígida e religiosa se reprimia, mas tudo passou… e não foram adquiridos vícios de monta ou referencia…
A chegada da maior idade e os vícios: ai sim aquisição de vícios, o de conduzir, conduzo ainda hoje por vício, não apenas por necessidade, e aquisição do mais terrível vício que mantenho, o “Fumo do Tabaco”. Sim eu sei, é terrível, faz mal à saúde, tudo isso eu sei, mas mesmo assim, não chego a formar vontade suficiente para o largar. Outro dos vícios adquiridos, e por oposição ao Tabaco esse sim construtivo, a poesia, comecei a escrever por um desafio, hoje sou viciado no género, diária mais sou um poeta maníaco-compulsivo, pois não consigo estar muito tempo sem escrever.
Finalmente o meu maior vicio, AMAR. Amo intensamente, e a cada dia, não apenas pelo amar, mas pela entrega e dádiva, não apenas um amar por conveniência, por comodismo, mas um amor consciente, dedicado, decidido a cada dia. Amar não é apenas um sentimento dedicado a uma pessoa, amar torna-se forma de vida, de estar e partilhar… sim eu sou um viciado, amo pelo vício do prazer e felicidade que isso me dá, não consigo ou quero curar-me, quero apenas espalhar este vício pelo mundo… há vícios e vícios, e há vícios que não devemos perder!..


O vício!

Janela, janela essa fechada ao mundo,
No meu vício, de me enclausurar em mim,
Aberta de vez em quando a matar um vício
Eu matar-me a mim! Lentamente,
Num fumo retumbante dissipado no ar,
Que me inunda a caixa torácica,
A rua, essa rua, a rua que separa janelas,
Essa abertas, ou fechadas,
Folhas secas que a atravessam
Empurradas pelo vento seco de agosto,
Num calor que o verão nos deixou,
Sem que o levasse a outras áridas paragens.

A torre, que do meu quarto perscruto no horizonte,
O toque das avé-marias,
Confronto o relógio, numa confrontação casual,
Maquinal talvez, no apressado movimento circular,
O toque, memórias passadas, convite,
O convite aos crentes, que creem,
Que se prostrem e orem, na reflexão do que são,
E eu? Quem sou aqui? Ninguém…

Ponte no horizonte, como qualquer outra ponte,
Que me atravessa para a outra margem
Sem que me leve a lugar nenhum…
Viajo, olhos postos no horizonte,
Vagos, vidrados, sem vida,
Mas parto, sem que tenha saído,
Viajo na mente, firmemente convencido
Que parti, sem realmente sair.
Da janela que abri à minha morte,
Par que um vício matasse,
Vejo também os prados do silêncio,
Local onde jazem os bons,
Onde repousam os que vos fazem falta,
Pois os maus nunca morrem…

Deixo lá fora, fora de ti, bem longe
Lezíria de palha seca, doirada
Sob um sol de fim de tarde
Que obliquamente te ilumina
Palha que queimo, neste fumo
Palha que tanto inquieta, nas matas, nos bosques
Nobres e voluntariosos homens da paz,
Que com o coração nas mãos
Se entregam pelo bem-estar dos outros,
Anónimos, sem rosto, os primeiros
Vítimas de desequilibrados seres humanos
Que para satisfação de um ego retorcido
Queimam, fazem arder, matam
E eu, aqui, inflamando com uma pedra o gás,
Que inflama a triste e seca palha do tabaco!

Não fumo no quarto,
Respeito? Talvez, mas o cheiro esse incomoda
Incomoda-me o cheiro, nas vielas sujas,
Do mendigo descalço,
Do obreiro transpirado ao meu lado
Num comboio apinhado
Num qualquer regresso a casa.
Viajo, mente inquieta,
Sento-me de novo,
Em frente a ti, nesta negra cadeira,
Com um negro estofo!
Não há na escrivaninha papeis,
Nem se encontra gasta pelo tempo,
Apenas tu, negro computador,
Escrevo-te, insultas-me, reparando erros,
Pois os dedos não acompanham
A velocidade da viagem!

Os dedos, esse apêndice tão humano,
Dedos que mudaram o mundo,
Que inquietos dão, oferecem-se,
Dão-se, e que tanto roubam ao assinar
Um qualquer decreto de impostos,
Os meus dedos, que teimam
Em não me obedecer!
Um deles em particular,
A que que a ti um dia ofereci,
Que te deixei marcar, para que todos soubessem
Que te pertenço, ou para a mim me lembrar,
Que me pertences, ou meramente
Saber que nos ligamos para a eternidade!

Aqui ao lado a janela, fechada,
Abra-o novamente, a querer matar
Um vicio que me mata,
Desgraça, o infortúnio, sem tabaco,
Saio apresado, pela rua deserta,
Cruzo a esquina, o sorte,
Ao fundo da rua, bem lá no fundo
A tabacaria, essa, está aberta!


ALBERTO CUDDEL

Poema de tributo ao autor que mais me impulsiona a escrever!

Inspirado no poema Tabacaria – Álvaro de Campos (um dos heterónimos de Fernando Pessoa)

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Alberto Cuddel pseudónimo de António Alberto Teixeira de Sousa nascido a 14 de Janeiro de 1973, no concelho de Baião, na margem norte do rio Douro, cedo rumou ao litoral no concelho de Vila do Conde, estudou até ao 12º Ano. Casou em 1995 tendo ir residir para o concelho da Maia, local onde permaneceu até 2008. Rumou à área metropolitana de Lisboa, onde actualmente reside no concelho de Vila Franca de Xira.
Começou a escrever poesia em 1993 sem nunca ter editado qualquer obra própria, já participou em algumas antologias, escreve essencialmente sobre o amor, as desilusões da vida, o quotidiano do sofrimento humano. Tem na sua cara-metade a fonte da inspiração. Cada momento da vida é um poema, com toda a carga emocional que isso acarreta, mas não sabe viver de outra forma.
Bibliografia:
Participei nas Antologias:
Os Poetas d’Hoje volume II
O Som dos Poetas
A Lagoa e a Poesia
Palavras de Veludo
Quando O Amor é cego
Blogs:
http://escritanoface.blogspot.pt
Com participação em:


http://editorapapel.blogspot.pt/2015/10/o-poder-do-vicio-6-concurso-literario_6.html?m1

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